Mensagem enviada por Felipe Svaluto ao blog do Reinaldo Azevedo, em 19.11.2008.
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Olá, Reinaldo. Já comentei outras vezes aqui, a última delas sobre livro que compara Orwell e Evelyn Waugh; agora, escrevo como a) professor de História da rede pública carioca, com pouco mais de dois meses de experiência; b) autor da primeira e principal denúncia de professor que o site Escola sem Partido recebeu.
Fiz a minha denúncia em 2004, quando do primeiro daqueles que viriam a ser nove semestres passados na Universidade Federal Fluminense, a niteroiense UFF. Na ocasião, eu havia acabado de suportar um semestre inteiro de História Antiga sem romanos e repleto de menções a Brizola, Charlton Heston (um “fascista fdp”, reproduzindo a sutileza analítica da mestra), greve, privatizações e MST. Colegas vários se incomodavam com as constantes interrupções na, digamos, ortodoxia da disciplina em prol desses comentários políticos algo aleatórios – na maioria das vezes, a professora não se dava nem ao trabalho de recorrer ao malandro disfarce da contextualização, da comparação ou alguma coisa que o valha. Mas poucos realmente pegaram a dimensão da coisa: paga pelo contribuinte, a antiga professora de Antiga se dedicava (e a gente soube depois que essa era a práxis dela no curso, para não perder a piada) a defender a troco de nada suas posições políticas a respeito de um rol espetacularmente largo de temas alheios ao conteúdo da disciplina.
Pois bem: denúncia feita, enfrentei a resistência esperada. A coisa ainda era apenas virtual quando professora outra me percebe como um maligno “ovo da serpente” na progressista universidade, não se furtando a expressar isso em grupo de e-mails que era então fórum tradicional de debates no curso; a mera exposição do que era falado sem pudores em sala foi visto como uma tentativa de censura, como se a professora funcionária pública não respondesse a nada nem ninguém. Numa mentalidade tipicamente corporativista, seres mil defenderam na internet e fora dela variações de um “roupa suja se lava em casa”, sugerindo mais ou menos abertamente que eu não deveria ter procurado “alguém de fora” para resolver o que um ou outro até enxergava mesmo como um problema; seguindo o mesmo isolacionismo acadêmico que em discurso tanto repudiam, a carta enviada por Miguel Nagib (idealizador do ESP) dando ciência da denúncia e concedendo direito de resposta à professora foi vista por alguns docentes e discentes como uma perversa ameaça censora. Discutindo no fórum virtual com professores e alunos, produzi páginas e páginas de Word defendendo minha posição, recebendo inclusive apoio parcial de alguns alunos menos reducionistas; muito disso se perdeu, mas trechos das mensagens de alunos e professores contrários à minha exposição continuam arquivados no site do Escola sem Partido, ocupando ainda posição de destaque por lá.
Enfim: tudo isso para dizer que percebi desde muito cedo o problema da doutrinação ideológica e o combati de frente, arriscando sabe-se lá quantas coisas em um ambiente que é (as mensagens armazenadas no ESP são apenas exemplos limitados do fenômeno; já vimos outros tantos aqui no blog) perversamente corporativista, como escrevi na mensagem anterior. Atendendo a pedido do próprio Miguel Nagib, que temia represálias e seguia modelo de site norte-americano similar, não assinei minha mensagem – mas deixei link para blog meu que tem e sempre teve autor devidamente identificado. A turma era pequena, muitos já conheciam minhas posições políticas e eu não vi razões para além do carreirismo que justificassem um mistério que dificilmente sobreviveria além de alguns poucos dias – eu jamais seria capaz de negar sonsamente a autoria da coisa se perguntado diretamente sobre, como de fato não neguei. Resumindo à Molusco: fui à chuva, me molhei e (surpresa!) passei pela intempérie sem precisar de pneumotórax ou tango argentino. Concluí meu curso com CR superior a 9, recebendo elogios explícitos e públicos de uns tantos professores e logo sendo bem classificado em concurso público relativamente difícil.
Por que falei tudo isso? Porque quem vê essa caixa de mensagens pode pensar que o Escola sem Partido vai a todo vapor, com o Miguel atarefadíssimo na análise de dezenas de denúncias sobre professores que chegariam todos os dias ao e-mail do site; considerando a maioria dos comentários que vi até agora aqui, estamos cheios de valentes na luta contra a doutrinação: há quem fale (em caixa alta) em “presença física” de pais em colégios; quem se coloque à disposição para a “crusada”; quem conte casos tão ou mais escabrosos que o meu… Mas ninguém cita nomes! Alguns sequer citam seus próprios nomes, acusam sob o manto do anonimato; outros citam apenas o primeiro nome, como se a internet fosse um rincão formado por capiaus que se conhecem todos. Em comum, ninguém (não que eu tenha visto) cita NOME COMPLETO de professor doutrinador; ninguém cita NOME E LOCALIZAÇÃO DE COLÉGIO… E isso porque comentam sobre casos passados, remotos até! Valentia em blog e sob anonimato é coisa muito fácil – e feia e nada condizente com os arroubos heróicos de uns e outros aqui. Fica então a minha sugestão aos valentes: denunciem os professores, com nome e sobrenome, ao Escola sem Partido; colaborem de fato, dêem as caras à tapa, apareçam à luz do sol diante dos petralhas todos – e dos metralhas, comunalhas e afins. Como diria o a plebe nem sempre ignara, falar é sempre muitoooo fácil…
Em tempo, Reinaldo: a matéria da VEJA (que li há tempos, assino a revista) muitas vezes – incluindo os comentários críticos sobre trechos de livros – só faz substituir uma doutrinação por outra. Já pensei em escrever sobre, mas acabei desistindo… Agora que você voltou ao tema me animei um tanto, talvez faça isso no feriadão. Ou volte aqui para comentar sobre também, se não for abusar muito… De toda forma, o Marcos (primeiro comentarista desse post) já deu a letra da coisa.
Abraços.