Por Luís Lopes Diniz Filho*
Há muitas coisas que podem ser comentadas no texto Por que apoio o MST, mas, para evitar a dispersão, vou me ater apenas ao elemento que me parece mais importante em relação ao tema da doutrinação no ensino, que é a questão da neutralidade e da objetividade. O professor doutrinador diz o seguinte “Nos primeiros quatro anos que convivemos com os alunos do MST, nós do mundo acadêmico tivemos a oportunidade de apreender (sic) com os (as) militantes do Movimento valores olvidados em nosso dia a dia de atividades de pesquisas e de ensino, numa universidade que parece fria diante do mundo ao redor“.
No meu entender, uma das ideias que abrem caminho para transformar a pesquisa em peroração ideológica e o ensino em doutrinação é justamente essa de aproximar a universidade do “mundo real”. Ora, eu não tenho nada contra que os professores universitários participem dos debates públicos e nem acho que a pesquisa tem de ser sempre “pura”. Pelo contrário, acho que a universidade deveria fazer mais pesquisas pagas, já que o mercado é, ao lado da democracia representativa, um dos melhores canais para que as demandas individuais e coletivas se expressem. Entretanto, quando os intelectuais críticos acusam a universidade de ser “fria”, devemos lembrar que tal afirmação só faz sentido para quem acha que as “verdades” a serem demonstradas pela ciência social já são conhecidas objetivamente por certos grupos sociais, cabendo então aos pesquisadores e professores propagandeá-las (com a emoção dos militantes, é claro!) e combaterem os discursos que se opõem a essas supostas “verdades”. Contudo, a função dos intelectuais é justamente o oposto disso: cabe a eles ter independência de pensamento para explicar os fenômenos sociais com a maior objetividade possível.
Ok, vão dizer que é impossível o pesquisador/professor separar fatos e valores em suas atividades de pesquisa e ensino, que essa presunção é coisa de positvista, etc e tal. Contudo, é perfeitamente possível e necessário produzir conhecimento tendo sempre em vista o compromisso de testar todas as hipóteses explicativas com base em métodos rigorosos, isto é, no uso de informações empíricas sistematizadas e, por isso mesmo, generalizáveis. Professor que defende determinados grupos políticos alegando que os valores deles são lindos e que os dos outros são nefandos simplesmente não serve para ser professor. É justamente por colocar a defesa de valores à frente do compromisso com a objetividade que ele se preocupa em denunciar os vícios das “classes dominantes” enquanto faz ouvidos moucos para as toneladas de evidências de atividades criminosas praticadas pelo “movimento” que ele apoia. E não vou nem comentar o que há de preconceito e de falhas de informação no discurso dele, senão isto aqui vira uma bíblia.
Em suma, é preciso que façamos a crítica dessa ladainha de que não existem pesquisa e ensino isentos, pois, se uma isenção total é talvez impossível, o compromisso com a objetividade não só é possível como obrigatório. Ele reside na preocupação com a coerência do discurso, no uso de métodos rigorosos de observação e de generalização e no procedimento de não descartar nenhuma hipótese de explicação de um fenômeno por qualquer critério que não seja empírico e metodológico.
O autor é Professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Paraná. Comentário postado em 10.03.2009, no grupo de discussão do Escola sem Partido.