Entrevista concedida pelo coordenador do ESP ao Diário de Mogi

Entrevista publicada em 20 de julho de 2014. Acompanhe aqui a repercussão da entrevista.

Movido por episódios que aconteceram em sua própria família, o advogado mogiano Miguel Nagib, 53, conhecido como Vacico, filho do empresário e cirurgião dentista Miguel Nagib, fundou e coordena o portal da internet Escola Sem Partido (www.escolasempartido.org), criado em 2004 contra a doutrinação política em sala de aula. A página recebe denúncias de estudantes e de pais a respeito de condutas de professores, consideradas por eles irregulares. 

O portal também divulga um anteprojeto de lei, elaborado por Vacico, que determina, entre outras coisas, a afixação em todas as salas de aula do ensino fundamental e do ensino médio de um cartaz com os “Deveres do Professor”. Estariam entre esses deveres “tratar de questões políticas, sócio-culturais e econômicas de forma justa, isto é, com a mesma profundidade e seriedade” e “abster-se de introduzir, em disciplina obrigatória, conteúdos que possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos estudantes ou de seus pais”.

Polêmico, o assunto vem tomando grandes proporções. Em Brasília, o advogado diz que tem feito muitos contatos. “O anteprojeto tem despertado muito interesse. A Comissão de Educação da Câmara dos Deputados acaba de aprovar a convocação de uma audiência pública para discutir o tema da doutrinação política e ideológica nas escolas. Ou seja, este assunto está na pauta do dia”, garante ele, que concedeu entrevista a O Diário sobre o assunto. (Sabrina Pacca)

Como e quando surgiu a ideia do senhor montar o site?

Sempre acompanhei, mais ou menos de perto, a vida escolar dos meus filhos. Eu tenho 4 filhos, e todos eles, como eu mesmo e a imensa maioria dos estudantes brasileiros, foram vítimas de professores que usam suas aulas para fazer a cabeça dos alunos. Um dia, em setembro de 2003, minha filha mais nova, então na 7º série do ensino fundamental, chegou em casa e disse que o seu professor de história — que era de esquerda como a maioria dos professores de história e cujas práticas doutrinárias eu já conhecia porque ele havia dado aula para o meu filho mais velho — havia comparado “Che” Guevara — um homem conhecido pela crueldade praticada em nome da sua utopia política — a São Francisco de Assis. Quando eu escutei aquilo, pensei: agora chega. Resolvi escrever uma carta aberta a esse professor, imprimi umas 300 cópias, e fui ao estacionamento do colégio distribuir aos pais que chegavam para deixar seus filhos. O efeito dessa iniciativa foi o mais inesperado para mim. A direção da escola contestou. Os alunos se solidarizaram inteiramente com o professor. Recebi dezenas de mensagens de estudantes me xingando de todos os nomes possíveis. Aquilo me impressionou muito e eu acabei me interessando pelo tema da doutrinação política e ideológica nas escolas. Lendo e conversando com outras pessoas, percebi que o problema era muito maior e mais grave do que eu imaginava. Foi então que, inspirado em alguns sites americanos, resolvi criar o ESP (Escola Sem Partido). 

Sofreu resistências quanto ao assunto?

Naturalmente, os professores não gostaram nem um pouco da nossa iniciativa, e por motivos óbvios, já que o nosso objetivo era e é impor limites ao que eles fazem em sala de aula; limites que decorrem da própria Constituição Federal, uma vez que a prática da doutrinação política e ideológica nas escolas ofende, de um lado, o princípio constitucional da neutralidade política e ideológica do Estado e, de outro, a garantia constitucional da liberdade de consciência. 

Quantas denúncias a respeito de professores influenciando alunos em sala de aula, politicamente, o senhor recebeu desde que assumiu essa causa? 

Não sei dizer quantas denúncias recebemos. Mas não foram poucas. O ESP é o único site em língua portuguesa inteiramente dedicado ao tema da doutrinação nas escolas. Por isso, muitos pais e estudantes que se sentem prejudicados por essa prática recorrem a ele.

O que é feito com essas denúncias? Viram processos judiciais?

Duas denúncias — uma feita pela mãe de uma aluna contra as apostilas do Sistema COC de Ensino, e outra por um estudante da FATEC, de Barueri, contra uma professora — viraram processos judiciais. Mas não contra a escola ou contra a professora denunciada, e, sim, por incrível que pareça, contra mim, que as publiquei. É um absurdo, mas é verdade. 

Como o senhor espera que, caso vire lei, a proposta do Escola Sem Partido funcione? Quem denunciará os chamados abusos? Quem fiscalizará?

O ESP elaborou um anteprojeto de lei contra o abuso da liberdade de ensinar. Esse anteprojeto está no nosso site à disposição de qualquer deputado estadual ou vereador que queira transformá-lo em projeto de lei e apresentá-lo à sua respectiva casa legislativa. Isto já aconteceu no Estado e no município do Rio de Janeiro, no Estado de Goiás e em Curitiba. Mais de 50 vereadores em todo o Brasil manifestaram a intenção de apresentar esse projeto no segundo semestre. O que nós estamos propondo é um choque de cidadania na escola. O principal objetivo do anteprojeto é informar e educar o estudante sobre o direito que ele tem de não ser doutrinado por seus professores e, ao mesmo tempo, informar e educar os professores sobre os limites éticos e jurídicos da sua liberdade de ensinar. É importante deixar claro que não se trata de cerceamento à liberdade de expressão do professor. Isto porque, em sala de aula, o professor não tem liberdade de expressão, mas, sim, liberdade de ensinar, o que é coisa muito diversa.

Quando o senhor coloca entre os comportamentos que denotam que o professor é doutrinador o fato dele “utilizar-se da função para propagar ideias de valor incompatível com os sentimentos morais e religiosos dos alunos, constrangendo-os por não partilharem das mesmas ideias e juízos”, o senhor não acredita que limita a ação do educador, já que se esse falasse, por exemplo, de questões como a inquisição ou até mesmo da Teoria da Evolução, de Charles Darwin, o estudante poderia denunciá-lo por não acreditar?

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (CADH) — que tem no Brasil hierarquia de norma constitucional, segundo a jurisprudência do STF — assegura aos pais o direito a que seus filhos recebam a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções. Por outro lado, a Constituição Federal assegura aos estudantes a liberdade de consciência e de crença. É dessa realidade jurídica e normativa que temos de partir, já que essas regras existem e são válidas. Quanto aos exemplos que você dá, observo o seguinte: a Inquisição é um fato histórico amplamente documentado. Logo deve ser estudado e ensinado em sala de aula com todo o rigor, e não na base do preconceito e do estereótipo, como sempre acontece. Agora, falar sobre a Inquisição e não falar sobre o papel da Igreja Católica na construção da Civilização Ocidental, suas contribuições no campo da ética, da moral, dos direitos humanos, da ciência, da educação, das artes, da filosofia, da assistência aos pobres e aos doentes é uma das formas mais desonestas de doutrinação. E isso, infelizmente, é o que mais se vê nas escolas hoje em dia. Já a Teoria da Evolução deve ser ensinada como o que ela realmente é, ou seja, uma teoria. Portanto, ao ensiná-la, o professor jamais deveria deixar de dizer aos alunos que ela não é uma refutação científica da crença no relato bíblico da criação, mas apenas uma teoria incompatível com a interpretação literal daquele relato.

Quanto aos professores, caso a ideia da Escola Sem Partido vire lei, o senhor acha que eles demorarão a se adequarem ao conceito?

Acredito que a maioria vai compreender de imediato a correção e a necessidade da proposta. Muitos professores podem não saber que a doutrinação política e ideológica em sala de aula é uma prática ilícita, mas eles sabem, no fundo, que é um ato de covardia. O professor abusar da autoridade que lhe é conferida pela cátedra; do poder de fato e de direito que exerce sobre os alunos; da circunstância de os alunos serem obrigados a assistir às suas aulas; do temor, da insegurança, da imaturidade, da falta de conhecimento e da inexperiência dos alunos para manipulá-los, para tentar cooptá-los, para tentar transformá-los em réplicas ideológicas de si mesmo, é um ato de suma covardia.

Fonte: http://www.odiariodemogi.com.br/cidades/cidades/24472-mogiano-quer-escola-sem-partido.html

 

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