A doutrinação é um problema grave na educação brasileira? Por quê?
Sim, por três razões.
Primeiro, porque consiste numa forma de cerceamento da liberdade de aprender do estudante, já que, numa de suas vertentes, essa liberdade – que é garantida expressamente pela Constituição Federal – compreende o direito do estudante de não ser doutrinado por seus professores. Trata-se, portanto, da violação a um direito fundamental.
Segundo, porque as principais vítimas dessa prática são jovens inexperientes e imaturos, incapazes de reagir, intelectual e emocionalmente, a um professor que esteja determinado a “fazer a cabeça” dos alunos.
E, terceiro, devido à extensão do fenômeno: segundo pesquisa realizada pelo Instituto Sensus (ver quadro abaixo), 80% dos professores da educação básica reconhecem que o seu discurso em sala de aula é “politicamente engajado”, e 78% acreditam que a principal missão da escola é “despertar a consciência crítica dos alunos”.
Mas o que há de errado em querer despertar a consciência crítica dos alunos?
Não haveria nada de errado, se esse “despertar da consciência crítica” não consistisse apenas e tão somente em martelar ideias de esquerda na cabeça dos estudantes.
Como se sabe, a visão crítica dos estudantes é direcionada sempre e invariavelmente para os mesmos alvos: a civilização ocidental, o cristianismo, os valores cristãos, a Igreja Católica, a “burguesia”, a família tradicional, a propriedade privada, o capitalismo, o livre-mercado, o agronegócio, o regime militar, os Estados Unidos, etc.
Em contrapartida, nada ou quase nada se diz aos alunos sobre os mais de 100 milhões de cadáveres produzidos pelo comunismo; sobre a repressão política e o fracasso econômico da antiga União Soviética; sobre a KGB, o Gulag, a Grande Fome 1932-1933; sobre a ditadura cubana, os presos políticos e a falta de liberdade naquele país; sobre os campos de reeducação e trabalho forçado na China comunista, etc.
Em suma, o olho crítico dos “despertadores de consciência crítica” só enxerga — quando não inventa — os pecados dos adversários políticos e ideológicos da esquerda; nunca ou rarissimamente os da própria esquerda.
Resultado: os estudantes adquirem uma visão distorcida da realidade.
O que o Escola sem Partido defende é o verdadeiro pensamento crítico, não essa fraude que tomou conta do sistema de ensino.
A doutrinação está presente apenas no ensino fundamental e médio ou ocorre também no ensino superior?
As práticas e conteúdos doutrinadores se disseminam em todos os níveis de ensino. No caso da universidade, a doutrinação já começa no processo seletivo, pois há inúmeros casos de questões de vestibular que forçam os alunos a assimilar e reproduzir teorias e ideologias afinadas com a esquerda intelectual e política para ter chances de ser aprovados.
O viés ideológico das provas se revela de diversas maneiras: na escolha de autores, textos e imagens; nas pressuposições; nas afirmações que são tidas como verdadeiras ou falsas; nas omissões; nos julgamentos; no recorte seletivo dos fatos; na apresentação de protagonistas como opressores e oprimidos, exploradores e explorados, algozes e vítimas, etc. Temas controvertidos são mostrados como se não o fossem.
Com isso, além de transformar esse exame num filtro ideológico de acesso ao ensino superior, o examinador militante sinaliza para o ensino médio qual o enfoque a ser adotado pelas escolas que almejarem bons índices de aprovação no vestibular.
Depois de ingressarem nos cursos, os alunos são submetidos à influência de professores que fazem comentários político-ideológicos em sala de aula mesmo quando o assunto pouco ou nada tem a ver com política (um problema que, vale dizer, não ocorre só no Brasil).
Mas é nos cursos universitários das áreas de educação, ciências humanas e sociais que as práticas e conteúdos doutrinadores se manifestam de forma mais explícita e ostensiva. No caso dos cursos de pedagogia e de licenciatura, as ideias de Paulo Freire são transmitidas aos alunos como se fossem verdades incontestáveis, muito embora esse autor veja o trabalho de ensinar como uma simples modalidade de proselitismo ideológico ao qual ele dá o nome de “conscientização” dos alunos. Já nas área de humanidades e de ciências sociais, em que os assuntos abordados nas matérias têm frequentemente relação direta com a política, o que se nota principalmente é o unilateralismo dos conteúdos, o qual se expressa na ampla predominância de autores críticos do capitalismo nas bibliografias utilizadas.
Afinal, existe neutralidade ideológica? A objetividade científica não é um mito?
A justificativa-padrão utilizada pelos promotores da doutrinação ideológica nas escolas é a de que “não existe imparcialidade”, já que “todo mundo tem um lado”. Para os professores e autores militantes, isto resolve o problema, pois, se não existe neutralidade, cada um que cuide de “puxar a brasa para a sua sardinha”.
A dose de má-fé embutida nesse raciocínio é extraordinária. O fato de o conhecimento ser vulnerável à distorção ideológica – o que é uma realidade inegável, sobretudo no campo das ciências sociais – deveria servir de alerta para que os educadores adotassem as precauções metodológicas necessárias para reduzir a distorção. Em vez disso, a militância utiliza esse fato como salvo-conduto para a doutrinação.
A perfeita objetividade científica pode ser impossível; mas perseguir o ideal da objetividade científica é não apenas possível, como moralmente obrigatório para um professor.
Com tantas fontes de informação hoje em dia, o ESP não estaria superestimando o poder do professor sobre o desenvolvimento das ideias e a formação do alunos?
De modo algum. O poder do professor é imenso, e a militância política sabe disso perfeitamente.
O estudante, em sala de aula, se encontra numa situação especialíssima, pois, além de ser obrigado a escutar e aprender o conteúdo transmitido por seu professor, ele deve ser capaz de reproduzir esse conteúdo se quiser obter boas notas e ser aprovado. Intelectualmente, portanto, o aluno está submetido à autoridade do seu professor.
O professor militante abusa dessa situação para “fazer a cabeça” dos alunos. E ele faz isso de boa consciência, porque pensa estar colaborando para “produzir uma realidade mais justa”. Na verdade, o que ele está produzindo é apenas mais um ignorante cheio de certezas, pronto para entregar os destinos da nação a políticos que pensam (ou fingem que pensam) como ele.
Os doutrinadores têm pleno conhecimento de que a reavaliação das idéias e convicções adquiridas durante a adolescência exige um investimento intelectual e emocional pesado demais para a maior parte das pessoas, de modo que a adesão a determinado credo ideológico, quando prestada durante essa fase crítica da vida, tende a prolongar-se por vários anos, quando não para sempre.
Quer dizer que os professores não deveriam expressar suas opiniões em sala de aula? Como fica a liberdade de ensinar, prevista na Constituição?
O ESP não contesta a liberdade do professor de expressar suas opiniões em sala de aula. Essa liberdade, contudo, não é absoluta. O professor não pode usá-la para “fazer a cabeça” dos alunos. A liberdade de ensinar do professor termina onde começa a liberdade de aprender do estudante, ambas previstas na Constituição Federal.
Além disso, é preciso considerar, sempre, a idade e o nível de conhecimento do público ao qual o professor se dirige: quanto mais imaturos e inexperientes os alunos, menos liberdade terá o professor para dizer o que pensa em sala de aula.
Em todo caso, não se pode perder de vista a advertência de Max Weber: “Em uma sala de aula, a palavra é do professor, e os estudantes estão condenados ao silêncio. Impõem as circunstâncias que os alunos sejam obrigados a seguir os cursos de um professor, tendo em vista a futura carreira; e que ninguém dos presentes a uma sala de aula possa criticar o mestre. É imperdoável a um professor valer-se dessa situação para buscar incutir em seus discípulos as suas próprias concepções políticas, em vez de lhes ser útil, como é de seu dever, através da transmissão de conhecimento e de experiência cientifica.
Não existe doutrinação de direita?
Existem professores de direita que usam a sala de aula para fazer a cabeça dos alunos. Mas são franco-atiradores, trabalham por conta própria. No Brasil, quem promove a doutrinação político-ideológica em sala de aula, de forma sistemática e organizada, com apoio teórico (Gramsci, Althusser, Freire, Saviani, etc.), político (governos e partidos de esquerda, PT à frente), burocrático (MEC e secretarias de educação), editorial (indústria do livro didático) e sindical é a esquerda.
O ESP é de direita?
O ESP não defende e não promove nenhum tópico da agenda liberal, conservadora ou tradicionalista. Logo, não é de direita.
Mas isso não impede que professores e estudantes de esquerda nos apliquem esse rótulo, com o objetivo de desqualificar o nosso trabalho. Fazem isso porque reconhecem que é a esquerda a única responsável pela instrumentalização do ensino para fins políticos e ideológicos; e, como nos opomos a essa prática, somos vistos como adversários ideológicos.
Ou seja: se combatemos uma prática da esquerda, temos de ser “de direita”. É assim que eles raciocinam.
Então, qual é a agenda do ESP?
Nossa luta se concentra nos seguintes objetivos:
1) Descontaminação e desmonopolização política e ideológica das escolas
– Sabemos que o conhecimento é vulnerável à contaminação ideológica e que o ideal da perfeita neutralidade e objetividade é inatingível. Mas sabemos também que, como todo ideal, ele pode ser perseguido. Por isso, sustentamos que todo professor tem o dever ético e profissional de se esforçar para alcançar esse ideal.
Paralelamente, é fundamental que as escolas adotem medidas concretas para assegurar a diversidade de perspectivas ideológicas nos seus respectivos corpos docentes. É certo que toda ideologia – seja de esquerda, de direita ou de outro gênero – atrapalha a nossa compreensão da realidade; mas nada atrapalha mais essa compreensão do que ver o mundo sob as lentes de uma única ideologia. Numa atmosfera onde concorram diversas ideologias, a visão necessariamente parcial oferecida por determinado enfoque ideológico pode ser confrontada, impugnada e complementada pela visão igualmente parcial oferecida por outra ideologia. E desse choque entre as diversas perspectivas o estudante poderá formar uma visão mais abrangente e complexa da realidade.
2) Respeito à integridade intelectual e moral dos estudantes
– Na sala de aula, o professor é a autoridade máxima. Os alunos devem respeitá-lo e obedecê-lo. Por isso, não é ético que o professor se aproveite dessas circunstâncias — isto é, da situação de aprendizado — para fazer a cabeça dos alunos.
3) Respeito ao direito dos pais de dar aos seus filhos a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convições
– Esse direito é expressamente previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos. A abordagem de questões morais em disciplinas obrigatórias viola esse direito. Daí a necessidade de que os conteúdos morais sejam varridos das disciplinas obrigatórias e concentrados numa única disciplina facultativa, a exemplo do que ocorre com o ensino religioso.
O que pode ser feito contra a doutrinação política e ideológica em sala de aula?
Os estudantes e seus pais podem e devem reclamar; os responsáveis pelas escolas podem e devem exigir uma postura mais ética por parte dos professores. Mas se o professor estiver realmente determinado a fazer a cabeça dos alunos, será muito difícil impedi-lo, tendo em vista a circunstância de os abusos ocorrerem no recinto fechado das salas de aula.
Por isso acreditamos que a única forma de combater a doutrinação é conscientizar diretamente os alunos (e, por tabela, também os professores) dos direitos compreendidos na sua liberdade de aprender.
Com esse objetivo, o ESP elaborou o Cartaz com os Deveres do Professor.
Defendemos que um cartaz como este seja afixado em todas as salas de aula das últimas séries do ensino fundamental, do ensino médio e dos cursinhos pré-vestibulares; e também nas salas dos professores.
Além de conscientizar os estudantes dos seus direitos – o que é uma questão de estrita cidadania –; e de dar-lhes os meios de que eles necessitam para se defender do professor militante, esse cartaz expressa um apelo à consciência moral do professor, recordando-o de que ao lado da sua liberdade de ensinar está a liberdade de aprender dos alunos.