Impeachment – Professores usam sala de aula para defender governo indefensável

Por Luís Lopes Diniz Filho*

O coordenador do site Escola Sem Partido, Miguel Nagib, encaminhou-me cópia de um e-mail que lhe foi enviado por uma professora, conforme segue:

Sou professora de geografia e em sala de aula não tenho tendência ideológica, basta colocar para os alunos os dados do IBGE e eles percebem que os oito anos do governo LULA foram os melhores para o país após a ditadura. melhora na qualidade de vida, moradias populares, a frota de carros aumentou 72%nos últimos doze anos, etc.

Em uma aula uma aluna me disse que o seu pai teria votado na Dilma e agora queria que ela saísse, eu pedi para que ela perguntasse para ele como era no governo Sarney e FHC, resumindo ele voltou atrás.

 

Em primeiro lugar, discordo da interpretação que a professora faz dos dados do IBGE, conforme já expliquei no livro Não culpem o capitalismo. E acrescento outras evidências apresentadas neste blog, como pode ser lido, por exemplo, nos textos abaixo:

Não houve “salto no IDH-M”, mas mudança na forma de cálculo

Redução da desigualdade começou com FHC e foi revertida pelo PT

Números provam que PT é um lixo

PT esconde números que provam que seus governos são lixo

Em segundo lugar, é preciso fazer algumas indagações: os alunos do ensino médio devem ser obrigados a assistir aulas de história e de geografia para que seus professores lhes “ensinem” qual governo foi o melhor? A função dessas disciplinas não deveria ser a de apresentar uma introdução a teorias científicas que tratam de fenômenos de longo prazo e que não ocorrem exclusivamente no Brasil? Nesse sentido, o mais correto em termos éticos e científicos não seria deixar de lado qualquer consideração explícita sobre governos específicos e se concentrar em transmitir informações factuais sobre processos de longo prazo e que possam ser explicados pela história, geografia e outras ciências?

Partidarização do ensino

Além disso, o comentário da professora deixa claro que o seu ponto de vista não só é ideológico como também partidário e contraditório.

O teor partidário e contraditório fica claro quando se considera uma questão de lógica elementar: a política econômica dos dois governos Lula foi a mesma aplicada no segundo mandato de FHC (câmbio flutuante, metas de inflação e de superávit primário). Por sinal, exatamente a mesma política que Lula, o PT e a maioria esmagadora dos professores tachavam de “neoliberal”… Mas, se a política macroeconômica foi continuísta, não tem nem cabimento supor que o período Lula poderia ter produzido um resultado muito melhor nessa área e menos ainda atribuir a diferença a qualidades próprias desse presidente ou de seu partido, pois qualquer resultado diferente só poderia ser efeito de mudanças na conjuntura internacional.

E os dados seguem a lógica, pois o crescimento da economia na era Lula foi puxado por uma dinâmica econômica internacional extremamente favorável. E, mesmo com o vento a favor, tal desempenho foi inferior ao de todos os outros Brics, à média de crescimento mundial e inferior também à média de crescimento da América Latina! Já nos governos de FHC, o desempenho da economia brasileira foi o mesmo da América Latina, demonstrando que, vis-à-vis a conjuntura internacional, esses governos foram melhores do que os petistas (Giambiagi; Schwartsman, 2014, p. 24) – e isso sem levar em conta o desastre posterior a 2013, pois aí é que o PT apanha mesmo.

Portanto, tentar usar indicadores de consumo para diferenciar qualitativamente os governos do PT daqueles que o precederam, como faz a professora, é cegueira ideológica a serviço de um partido que cometeu estelionato eleitoral, pois afronta tanto a lógica quanto o exame comparativo dos indicadores internacionais. E isso para não mencionar que, quando a conjuntura internacional mudou e a política econômica herdada de FHC foi sendo erodida pelo relaxamento progressivo das metas – algo que começou a acontecer em 2008, ainda no tempo de Lula – a inflação subiu e o crescimento econômico, que já era baixo para os padrões da época, declinou até se transformar na depressão que vivemos hoje.

Ideologia na veia

Já o momento em que o viés ideológico da professora se escancara mais plenamente é quando ela diz que convenceu o pai de uma aluna a se posicionar contra o impeachment de Dilma dizendo que os governos do PT teriam sido melhores do que os anteriores. Ainda que eu concordasse com essa avaliação do governo, teria de objetar o seguinte: o regime democrático é o império da lei, e a Constituição não diz que um presidente deve sofrer impedimento quando faz um governo “ruim” e nem que deve ser poupado disso caso seu governo seja “bom”;  o que a Constituição determina é que um presidente sofrerá impeachment quando praticar algum crime, aí incluídos crimes de responsabilidade. E não há dúvida de que Dilma cometeu crime de responsabilidade por conta das “pedaladas fiscais”, faltando ainda investigá-la para saber se cometeu também outras ilegalidades relacionadas ao “petrolão” e à possível “venda de medidas provisórias”.

Portanto, ao dizer que Dilma merece ficar devido à suposta superioridade dos governos do PT, a professora deixa claro seu menosprezo pela institucionalidade, o que é uma atitude típica da esquerda radical, para quem os fins justificam os meios e as leis são apenas instrumentos de dominação de classe ou dos “grupos hegemônicos”.

GIAMBIAGI, F.; SCHWARTSMAN, A. Complacência. 1. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.

* Professor do Departamento de Geografia da UFPR

O coordenador do site Escola Sem Partido, Miguel Nagib, encaminhou-me cópia de um e-mail que lhe foi enviado por uma professora, conforme segue:
Sou professora de geografia e em sala de aula não tenho tendência ideológica, basta colocar para os alunos os dados do IBGE e eles percebem que os oito anos do governo LULA foram os melhores para o país após a ditadura. melhora na quaidade de vida, moradias populares, a frota de carros aumentou 72%nos últimos doze anos, etc.
Em uma aula uma aluna me disse que o seu pai teria votado na Dilma e agora queria que ela saisse, eu pedi para que ela perguntasse para ele como era no governo sarney e FHC, resumindo ele voltou atrás.

Em primeiro lugar, discordo da interpretação que a professora faz dos dados do IBGE, conforme já expliquei no livro Não culpem o capitalismo . E acrescento outras evidências apresentadas neste blog, como pode ser lido, por exemplo, nos textos abaixo:

Em segundo lugar, é preciso fazer algumas indagações: os alunos do ensino médio devem ser obrigados a assistir aulas de história e de geografia para que seus professores lhes “ensinem” qual governo foi o melhor? A função dessas disciplinas não deveria ser a de apresentar uma introdução a teorias científicas que tratam de fenômenos de longo prazo e que não ocorrem exclusivamente no Brasil? Nesse sentido, o mais correto em termos éticos e científicos não seria deixar de lado qualquer consideração explícita sobre governos específicos e se concentrar em transmitir informações factuais sobre processos de longo prazo e que possam ser explicados pela história, geografia e outras ciências?

Partidarização do ensino

Além disso, o comentário da professora deixa claro que o seu ponto de vista não só é ideológico como também partidário e contraditório.

O teor partidário e contraditório fica claro quando se considera uma questão de lógica elementar: a política econômica dos dois governos Lula foi a mesma aplicada no segundo mandato de FHC (câmbio flutuante, metas de inflação e de superávit primário). Por sinal, exatamente a mesma política que Lula, o PT e a maioria esmagadora dos professores tachavam de “neoliberal”… Mas, se a política macroeconômica foi continuísta, não tem nem cabimento supor que o período Lula poderia ter produzido um resultado muito melhor nessa área e menos ainda atribuir a diferença a qualidades próprias desse presidente ou de seu partido, pois qualquer resultado diferente só poderia ser efeito de mudanças na conjuntura internacional.

E os dados seguem a lógica, pois o crescimento da economia na era Lula foi puxado por uma dinâmica econômica internacional extremamente favorável. E, mesmo com o vento a favor, tal desempenho foi inferior ao de todos os outros Brics, à média de crescimento mundial e inferior também à média de crescimento da América Latina! Já nos governos de FHC, o desempenho da economia brasileira foi o mesmo da América Latina, demonstrando que, vis-à-vis a conjuntura internacional, esses governos foram melhores do que os petistas (Giambiagi; Schwartsman, 2014, p. 24) – e isso sem levar em conta o desastre posterior a 2013, pois aí é que o PT apanha mesmo.

 

Portanto, tentar usar indicadores de consumo para diferenciar qualitativamente os governos do PT daqueles que o precederam, como faz a professora, é cegueira ideológica a serviço de um partido que cometeu estelionato eleitoral, pois afronta tanto a lógica quanto o exame comparativo dos indicadores internacionais. E isso para não mencionar que, quando a conjuntura internacional mudou e a política econômica herdada de FHC foi sendo erodida pelo relaxamento progressivo das metas – algo que começou a acontecer em 2008, ainda no tempo de Lula – a inflação subiu e o crescimento econômico, que já era baixo para os padrões da época, declinou até se transformar na depressão que vivemos hoje.

 

Ideologia na veia

 

Já o momento em que o viés ideológico da professora se escancara mais plenamente é quando ela diz que convenceu o pai de uma aluna a se posicionar contra o impeachment de Dilma dizendo que os governos do PT teriam sido melhores do que os anteriores. Ainda que eu concordasse com essa avaliação do governo, teria de objetar o seguinte: o regime democrático é o império da lei, e a Constituição não diz que um presidente deve sofrer impedimento quando faz um governo “ruim” e nem que deve ser poupado disso caso seu governo seja “bom”;  o que a Constituição determina é que um presidente sofrerá impeachment quando praticar algum crime, aí incluídos crimes de responsabilidade. E não há dúvida de que Dilma cometeu crime de responsabilidade por conta das “pedaladas fiscais”, faltando ainda investigá-la para saber se cometeu também outras ilegalidades relacionadas ao “petrolão” e à possível “venda de medidas provisórias”. 

 

Portanto, ao dizer que Dilma merece ficar devido à suposta superioridade dos governos do PT, a professora deixa claro seu menosprezo pela institucionalidade, o que é uma atitude típica da esquerda radical, para quem os fins justificam os meios e as leis são apenas instrumentos de dominação de classe ou dos “grupos hegemônicos”.

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GIAMBIAGI, F.; SCHWARTSMAN, A. Complacência. 1. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.

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