Leia a petição inicial da ação civil pública movida pelo Ministério Público de Minas Gerais contra a mantenedora do Colégio Santo Agostinho, em Belo Horizonte. Com as devidas adaptações, a petição inicial pode servir de modelo para pais que se sintam lesados pela imposição da ideologia de gênero processarem a escola dos seus filhos, lembrando que a lei dos Juizados Especiais não exige a representação por meio de advogado se o valor da causa for inferior a 20 salários mínimos.
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Excelentíssimo(a) Sr. (a) Juiz(a) de Direito da Vara Cível da Infância e Juventude de Belo Horizonte/MG
O Ministério Público do Estado de Minas Gerais, por seus Órgãos signatários, legitimado pelo caput do artigo 127 e pelos incisos II e III do artigo 129, todos da Constituição da República, pela alínea a do inciso IV do artigo 25 da Lei nº 8.625/1993, nos incisos IV e VI do artigo 66 da Lei Complementar Estadual nº 34/1994, no inciso I do artigo 5º da Lei nº 7.347/1985 e no inciso V do artigo 201 da Lei nº 8.069/1990, com fulcro no inciso IV do artigo 3º, nos artigos 6º, 220, 226, 227 e no artigo 229, todos da Constituição da República, no inciso IV do artigo 1º da Lei nº 7.347/1985 e na Lei nº 8.069/1990, vem perante Vossa Excelência propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROTETIVAc/c Ação para Apuração de Infração Administrativa contra a Sociedade Inteligência e Coração, pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o número 17.222.969/0001-00, com sede na Rua Mato Grosso, nº 936, Bairro Santo Agostinho, em Belo Horizonte, pelos fundamentos de fato e de direito a seguir expostos:
I – DOS FATOS
1- A Sociedade Inteligência e Coração – SIC, é uma entidade filantrópica de educação e assistência social sem fins lucrativos e é mantenedora do Colégio Santo Agostinho nas unidades situadas nas cidades de Belo Horizonte, Nova Lima e Contagem.
2- Em 6 de novembro de 2017, foi aberto na 23ª Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente Cível de Belo Horizonte o Inquérito Civil Público nº MPMG – 0024 17 017735-6, em razão do recebimento de uma Representação feita por um grupo pais de alunos do Colégio Santo Agostinho, na qual questionavam a inclusão na proposta pedagógica do referido estabelecimento escolar do que denominaram Ideologia de Gênero, contidano material didático destinado à crianças da 3ª à 6ª séries do ensino fundamental.
3- Segundo os Representantes, após terem questionado os fatos junto à direção do estabelecimento de ensino, não lhes foi dada nenhuma resposta específica, tendo o Colégio respondido apenas com missivas genéricas destinadas à comunidade escolar como um todo, sempre negando a inclusão da Ideologia ouTeoria de Gênero em sua proposta pedagógica e materiais didáticos.
4- Os referidos pais reclamaram da inclusão e abordagem de assuntos impróprios nas aulas ministradas aos filhos, por entender que esses não teriam maturidade para compreendê-los ou discerni-los, informando que após queixas dos mesmos divulgaram uma “carta aberta” aos diretores do Colégio Santo Agostinho, seguida de uma “notificação extrajudicial”, facultando prazo de 20 (vinte) dias para esclarecimento por escrito, não tendo a Ré, entretanto, se manifestado.
5- Questionaram, ainda, a discussão nas escolas da Ré de alguns textos literários impróprios para a idade dos filhos e a abordagem do tema da identidade de gênero de forma transversal, em várias matérias da grade escolar.
6- Nos autos do referido Inquérito Civil Público, após ser intimada sobre o conteúdo da Representação e dos documentos que a acompanharam, a Ré disse em sua resposta que somente cumpriu o disposto nos artigos 205 e 206 da Constituição federal, e que visa promover, por meio da educação, o pleno desenvolvimento da pessoa e sua capacitação para a cidadania, sendo que teria respeitado, também, o contido na Lei nº 9.394/1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que estabelece como fundamento do ensino no país o pluralismo de ideias e a liberdade de aprender e ensinar.
7- Asseverou a Ré que teria seguido as diretrizes do Plano Nacional de Educação-PNE, estabelecidas pela Lei nº 13.005/2014, como a promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos e à diversidade, incluindo aí a de gênero, de modo a combater a violência doméstica e sexual e contribuindo para a construção de uma cultura de paz no ambiente escolar.
8- O Colégio afirma ter atendido ao estabelecido nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs editados pelo MEC, os quais orientariam os educadores no cumprimento de certos objetivos do ensino fundamental, como o de capacitar o aluno para adotar no seu dia-a- dia atitudes de cooperação, respeito e de repúdio às injustiças.
9- A Ré aduziu que agiu, e ainda age, em estrita obediência a tais diretrizes estabelecidas pelo MEC, as quais recomendam uma abordagem transversal de temas relacionados com os direitos humanos, como a orientação sexual e a sexualidade, tudo com o intuito de promover junto ao alunado uma compreensão crítica da realidade e ao invés de tratar tais assuntos como dados meramente abstratos, permitir que as crianças deles se apropriem como instrumentos para refletir sobre a própria vida.
10- Dizendo-se escudada em uma decisão monocrática de um Ministro do STF, que relata a importância da inclusão na esfera educacional formal de temas sobre a diversidade sexual para crianças e adolescentes, a Ré terminou sua manifestação reconhecendo que não poderia ter negligenciado ou se omitido sobre a abordagem da temática de gênero em suas salas de aula, pois isso supostamente deixaria seus alunos expostos aos perigos da ignorância sobre o assunto, afirmando que ao contrário do alegado pelos pais representantes, teria contribuído para assegurar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social do seu alunado.
É o breve relato
II – DO DIREITO
11- Para contextualizar os fundamentos da discussão que ora se impõe e avaliar a virtual ilegalidade da conduta da Ré, que ao fazer uso de algumas práticas supostamente pedagógicas, infringiu o disposto no artigo 98 da Lei nº 8.069/1990[1], o Estatuto da Criança e do Adolescente, expondo à situação de risco pessoal parte do seu alunado, em primeiro lugar é preciso compreender o conteúdo da denominada Teoria de Gênero e o seu real alcance no mundo nos dias de hoje.
12- A Teoria de Gênero não é uma ideia nova, emergida de uma hora para outra em nossa sociedade e no ambiente escolar como um modismo passageiro. Na verdade, já há algumas décadas, ela serve como base doutrinária de um movimento internacional articulado, defendido e difundido por setores dos meios político, acadêmico e midiático nacionais e embora a regra não seja apresentar-se com este nome, certamente não é algo surgido espontaneamente, ou fruto de um acontecimento casual.
13- Destarte, a Teoria de Gênero já há algum tempo vem sendo construída como ideologia política e desenvolvida por alguns teóricos, dentre os quais se destacam duas autoras ocidentais.
14- A primeira delas é a feminista canadense Shulamith Firestone, cuja principal obra é o livro A Dialética do Sexo[2], publicado na década de 1970.
15- Segundo Firestone, que pretendia substituir a luta de classes pela guerra dos sexos, deveria haver um paralelo entre a revolta do proletariado e o levante das mulheres, supostamente tratadas pela sociedade como uma classe sexual inferior, cujo objetivo seria acabar com os privilégios e a opressão masculinos.
16- Na sociedade ideal concebida pela autora, baseada numa suposta existência de uma idílica era onde a mulher teria exercido seu poder pelo afeto e o respeito e não pela força, não deveria haver distinção sexual, nem o controle da reprodução, devendo as mulheres serem libertas do que denominou de escravidão da maternidade, como supostamente ocorria nas sociedades primitivas.
17- A partir de tal lógica, a referida autora questiona a realidade biológica da espécie humana, dividida entre homens e mulheres, denominados por ela como classes sexuais, cuja educação diferenciada e distinta teria dado origem às desigualdades, privilégios e injustiças sociais. Segundo seu entendimento, estaria na diferença natural reprodutiva existente entre os sexos a origem da primeira divisão do trabalho e as conseguintes divisões posteriores de classes sociais.
18- Por outro lado, Firestone não vê o aspecto binário da natureza humana como um obstáculo a sua utopia e sugere a superação de tal realidade propondo a liberdade sexual absoluta, com a abolição de todo tipo de restrição relacionada às práticas sexuais entre os seres humanos, incluindo até mesmo crianças e os membros de uma mesma família natural, derivando daí a eliminação de qualquer modo de organização familiar. Por isto, considerava o tabu do incesto como um dos pressupostos da preservação da família heteronormativa e opressora, o qual precisaria desaparecer:
“É possível que a criança estabeleça suas primeiras relações físicas íntimas com pessoas do seu próprio tamanho, por mera conveniência física, exatamente como os homens e mulheres podem preferir um ao outro em vez de pessoas do mesmo sexo, por mera conveniência física. Mas, se ao contrário ela escolhesse se relacionar sexualmente com os adultos, mesmo que isso se desse com sua própria mãe genética, não haveria razões a priori para ela rejeitar seus avanços sexuais, uma vez que o tabu do incesto teria perdido o valor”[3]
19- Inspirada por Herbert Marcuse, autor de Eros e Civilização (1955), livroonde o filósofo em questão afirma ser a repressão sexual a origem de toda dinâmica social patológica e responsável pela violência das guerras e assassinatos em massa, defendendo a liberação do prazer como ato de oposição a tal estado de coisas, Shulamith Firestone advoga que todo programa feminista verdadeiramente revolucionário deveria incluir como bandeira, necessariamente, o fim da opressão sexual, inclusive das crianças, preconizando, destarte, a abolição da infância e a liberação do início da prática sexual por infantes na mais tenra idade.
20- A referida autora considera, do mesmo modo, que a liberação da libido e a satisfação desenfreada dos impulsos sexuais iria nos conduzir a uma sociedade virtuosa, apontando como inerente e necessária a vinculação entre a libertinagem sexual e a libertação política e econômica.
21- Trilhando a mesma linha de raciocínio, a filósofa americana Judith Buttler, feminista e professora de retórica da Universidade de Berkeley, na Califórnia – EUA, autora do livro Problemas de Gênero-feminismo e subversão da identidade, publicado no Brasil pela Editora Civilização Brasileira, representa em relação à Firestone um ponto à frente na defesa da Teoria de Gênero, na medida em que estabelece sua base conceitual atual, também ignorando a natureza binária sexual da espécie humana, pois na sua visão não existem o homem e a mulher do ponto de vista biológico, sendo apenas acultura que os tornaria de um ou de outro sexo.
22- Na esteira de Simone de Beauvoir, autora do livro O Segundo Sexo(1949) e célebre pela frase “ninguém nasce mulher: torna-se mulher”,onde coloca a mulher como um conceito socialmente construído pelo homem, seu opressor, Judith Buttler diz que seria a matriz heteronormativa da sociedade ocidental, por meio da sua lógica médico-jurídica, a responsável pela definição do comportamento sexual das pessoas, impondo-nos a noção binária dos sexos masculino e feminino, o que geraria uma sociedade falocêntrica e voltada à reprodução, onde a mulher, do mesmo modo, seria oprimida pelo homem.
23- Afirma que os sexos masculino e feminino enquadram-se em uma falsa categoria biológica e imutável, sendo necessária a libertação de tais conceitos com sua diluição na identidade de gênero, afirmando, ainda, que cada pessoa se identificaria com o que quisesse, sendo, portanto, os falsos paradigmas do homem e da mulher apenas duas categorias dentre tantas outras, a serem tratadas em pé de igualdade.
24- Nesse contexto, o gênero dependeria da subjetividade, do desejo e da autopercepção de cada um, sendo, assim, um modo de agir, uma performance em constante mutação, uma construção inefável e jamais estática, sempre dependente do próprio livre-arbítrio e das influências culturais, completamente desvinculado do que considera ser uma falsa pré-determinação biológica, definida pelo binômio biológico homem/mulher.
25- Sob seu ponto de vista o movimento feminista tradicional teria chegado a um limite, pois a representação da mulher universal, com direitos iguais aos do homem, serviria apenas para dar uma aparência de unidade às mulheres enquanto categoria, escamoteando outras diferenças, estas sim reais, como as divisões de raças e de classes sociais.
26- No seu modo de ver o mundo a noção binária dos sexos serviria apenas para agregar ilusoriamente as classes sociais, de modo a promover uma sociedade juridicamente heteronormativa e opressora, sob o domínio masculino e patriarcal.
27- Na sua opinião, haveria, portanto, uma luta política no seio da nossa sociedade, impondo a todos uma falsa identidade comum, da qual decorreriam as estruturas sociais em que vivemos e apenas a reinterpretação e a reformulação das identidades masculina e feminina, colocando um fim à falsa compulsoriedade do desejo de um sexo pelo seu oposto, seria capaz de combater e subverter tal estado de coisas.
28- Assim como Simone de Beauvoir, Judith Buttler é existencialista, pois considera o ser humano e sua natureza como resultado exclusivo de processos históricos e culturais, incluindo aí o seu sexo, o qual não guardaria relevância como um dado natural, criando um novo conceito para o termo gênero.
29- Ela é adepta de uma retórica da subversão social, que nega a existência ontológica dos sexos masculino e feminino, confundindo conceitos semânticos e jurídicos basilares para nossa sociedade.
30- Propõe uma nova política feminista extremista, que não aceita nem mesmo o conceito hodierno de mulher, pois tal reconhecimento pressuporia a existência do macho falocêntrico, sendo ambos, no seu entender, apenas papéis de uma ficção criada com a finalidade exclusiva de oprimir e dominar.
31- Como se pode observar, a ideia central e fundamental que identifica e aproxima as autoras em questão é a afirmação da falácia ou da relatividade da divisão biológica da espécie humana entre homens e mulheres, asseverando serem os papéis sociais dela decorrentes meros estereótipos e responsáveis por uma sociedade dividida e injusta, a qual propõem subverter.
32- Obviamente, esse tipo de abstração é questionado pela medicina, que coloca o discurso de gênero na contramão da ciência.
33- Segundo a Associação Americana de Pediatras[4] a sexualidade é um traço biológico binário objetivo, sendo os cromossomos XY e XX marcadores de saúde e não de um distúrbio.
34- Desse fato biológico decorrem a existência do macho e da fêmea da espécie, cujo propósito é a sua reprodução, pois ninguém nasce com gênero, mas nasce com um sexo biológico.
35- A troca de sexos é algo impossível do ponto de vista genético e o fato de alguém se identificar com o sexo oposto, ou em algum lugar entre os dois sexos, não cria um terceiro sexo.
36- Este é um princípio autoevidente que traz um sentido de normalidade para o desenvolvimento da espécie humana, colocando os raros casos de disforia de gênero (DG) como um problema da mente e não de corpo.
37- Tais casos (DG) são um traço estatístico dentre a população mundial e quando ocorre em crianças, em 90% (noventa por cento) dos casos tais pessoas aceitam seu sexo biológico até o início da puberdade.
38- Recentemente o Conselho Regional de Medicina de São Paulo-CREMESP[5] se manifestou contrariamente às ideias defendidas pela Teoria de Gênero, afirmando em nota a necessidade do cuidado com a saúde mental de crianças e adolescentes, sob pena de se trazer consequências danosas para a formação de seu aparelho psíquico.
39- Diz o CREMESP que a educação sexual é muito diferente do incentivo à indefinição sexual, o que traz aos infantes insegurança sobre sua condição pessoal e risco para seu sadio desenvolvimento, deixando claro que as diferenças sexuais existem e devem ser observadas com o objetivo de não se estabelecer uma confusão mental nos infantes e jovens.
40- Como se vê, não resta dúvida de que a Teoria de Gênero afronta a natureza humana e para confirmar tal assertiva, basta tomarmos como exemplo a figura do incesto, desabridamente defendido por Firestone e tido como um tabu pela nossa sociedade.
41- Na verdade, por trás deste interdito existe hoje uma sólida base científica, considerando que os cruzamentos consanguíneos têm evidentes efeitos deletérios, comprometedores do desenvolvimento das espécies, como menos tolerância à doenças, fragilidade da estrutura óssea, maior suscetibilidade à morte prematura dos indivíduos e, por fim, o mais grave, o aumento da possibilidade de mutações genéticas.
42- Os problemas causados pelo incesto já há muito foram constatados pelos homens por meio da simples observação da natureza, resultando daí ter sido erigido há milênios como uma prática vedada pela moral, presente em todas as organizações sociais humanas, bem antes da sua comprovação científica.
43- Na realidade, tal exemplo deve servir para orientar o cuidado a ser tomado em qualquer análise minimamente séria sobre a nossa natureza sexual e o seu papel na história pretérita e futura do desenvolvimento da humanidade.
44- Portanto, estereotipar e tentar relativizar os papéis masculinos e femininos e as funções sociais deles decorrentes ao longo da história, sem qualquer análise ou consideração sobre a real influência do meio ambiente e da biologia nos mesmos é, no mínimo, intelectualmente desonesto e perigoso.
45- Embora a espécie humana tenha conseguido construir nos dias de hoje uma sociedade urbana, onde o acesso aos bens de consumo necessários a nossa sobrevivência é relativamente fácil e aparentemente desvinculado das suas origens naturais, de fato, as coisas nem sempre foram assim, sendo certo que a divisão do trabalho entre homens e mulheres tem sido ao longo da nossa existência uma estratégia essencial para este sucesso.
46- É importante não esquecer que mesmo em um regime democrático, onde há isonomia jurídica entre homens e mulheres, a norma não pode desprezar as diferenças biológicas inerentes à divisão binária dos sexos, pois para se tratar as pessoas com verdadeira igualdade há que se considerar as distinções decorrentes da sua natureza.
47- Ao olvidar as evidentes distinções biológicas existentes entre os sexos, seja repudiando, denegrindo ou desconsiderando o seu efeito prático no comportamento humano, bem como a sua importância na construção da sociedade, a Teoria de Gênero impede que os seres humanos se reconheçam como autores da própria história, colocando em risco a ordem social existente, notadamente em um contexto de crise.
48- De fato, as óbvias diferenciações biológicas existentes entre os homens e as mulheres sempre foram levadas em consideração, principalmente em momentos de desordem social aguda, como, por exemplo, em épocas de conflitos armados, quando, tradicionalmente, os machos da espécie humana vão lutar e as fêmeas permanecem na retaguarda, de modo a permitir a reconstrução do grupo social após o término do conflito.
49- Não é preciso ir muito longe para se constatar tal realidade, bastando tomarmos o exemplo do que ocorre em algumas cidades do nosso país, notadamente no Rio de Janeiro, onde há regiões conflagradas por conflitos de baixa intensidade, decorrendo daí, infelizmente, a morte de cidadãos inocentes e de expressivo número de agentes das forças de segurança.
50- Segundo as estatísticas apresentadas, apenas nos anos de 2016 e 2017 foram baleados no Estado do Rio de Janeiro 684 (seiscentos e oitenta e quatro) policiais, vindo a falecer o total de 245 (duzentos e quarenta e cinco) agentes, dentre eles apenas três mulheres[6]. Apesar das forças de segurança aceitarem e treinarem mulheres em suas fileiras, nenhuma das três foi atingida em razão do confronto armado direto com os bandidos, que é uma função tipicamente masculina.
51- Nesse sentido, a própria Teoria da Evolução de Charles Darwin demonstra como a natureza pode ser implacável e problemáticas nossas limitações diante dela, notadamente ante a ocorrência de mudanças bruscas provocadas no ambiente em que vivemos, sendo temerária a defesa de uma teoria que, sem qualquer reflexão, propõe a desordem de um sistema de divisão do trabalho existente entre homens e mulheres até agora exitoso, taxando-o de iníquo e responsável pelas injustiças sociais.
52- A falta de embasamento científico e social da Teoria de Gênero e o seu uso como agenda política e de doutrinação por seus defensores ficaram claros após a exibição do documentário O Paradoxo da Igualdade – que pode ser visto no YouTube – apresentado pelo sociólogo Harald Eia[7], o qual levou o Conselho Nórdico de Ministros – uma organização de cooperação interparlamentar da Noruega, Suécia, Finlândia, Dinamarca e Islândia – a cortar os fundos para o instituto Nórdico de Gênero – NIKK, que foi por décadas o grande promotor da Teoria de Gênero em tais países.
53- Nesse passo, com tais características e defendendo um ponto de vista tão mirabolante e radical, a Teoria de Gênero não poderia revelar-se por inteiro e apresentar suas ideias com clareza à sociedade, razão porque optou por introduzi-las através de um discurso que embuce seu real objetivo.
54- Consequentemente, a estratégia inicial dos seus defensores foi e ainda tem sido a de imiscuí-la no âmbito da defesa dos direitos humanos, colocando-a no seio do combate a todas as formas de discriminação, notadamente contra a discriminação de origem sexual, encravando sua agenda em um discurso autointitulado politicamente correto, onde pudesse passar desapercebida.
55- Assim, a agenda de gênero aderiu, sem maiores questionamentos, ao movimento de defesa dos direitos das mulheres e de homossexuais, como se a negação da existência dos sexos biológicos e a subversão da identidade sexual das pessoas, pudesse favorecer a luta deste público contra a discriminação.
56- Foi exatamente desta maneira, confundindo e não explicando, que a Teoria de Gênero passou a ser uma bandeira de algumas agências da ONU – Organização das Nações Unidas.
57- Na verdade, alguns segmentos da ONU, o mais insuspeito dos organismos internacionais, vêm sofrendo com a ingerência de organizações não-governamentais – ONGs, que os estão usando como meio de propagação de uma doutrina exótica e fundamentalista.
58- Desde a última década do Século XX, boa parte das atividades da ONU consiste na realização de conferências internacionais, preparadas com larga influência de determinadas ONGs, financiadas por grandes corporações internacionais, que as utilizam para tentar impor ao mundo suas ideias.
59- Tais conferências são atualmente uma das principais atividades da ONU e foi exatamente por meio de uma delas que a Teoria de Gênero apareceu, pela primeira vez, em um documento oficial da referida Entidade.
60- Isto se deu na IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em Pequim, no ano de 1995, cujo documento resultante introduziu o termo e a perspectiva de gênero, a serem observados de forma transversal em todas as políticas públicas nos países-membros da ONU.
61- A delimitação conceitual de gênero veio a ocorrer apenas em 2006, na Conferência de Yogyakarta, realizada na Indonésia, que nos seus princípios sobre a aplicação da legislação internacional de direitos humanos em relação à orientação sexual e identidade de gênero (documento de fls. 325/363), ainda no seu preâmbulo, definiu o termo identidade de gênero como referido à “experiência interna, individual e profundamente sentida que cada pessoa tem em relação ao gênero, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, envolvendo, também, o sentimento em relação ao corpo, com a modificação da sua aparência, modo de vestir, falar e outros maneirismos”, sendo como se vê um conceito impreciso, confuso e pouco esclarecedor.
62- Embora tal declaração seja um documento hoje aceito pela ONU, ele foi discutido, escrito e subscrito apenas por “especialistas” vinculados às universidades e à ONGs de defesa dos direitos humanos e dos direitos dos homossexuais, tendo o Brasil sido representado, na oportunidade, por uma pesquisadora de uma associação de estudos sobre AIDS, sexualidade e política.
63- Sendo assim, é interessante notar como a Teoria do Gênero, que tem como principal objetivo subverter a heteronormatividade social,vem sendo disseminada no mundo e, particularmente, em nosso país sempre com um viés “técnico” e não político, tudo com o objetivo de escapar de uma discussão mais ampla na sociedade, permanecendo como uma emanação de burocratas e de nichos de intelectuais e sábios eruditos, notadamente dos meios acadêmicos e educacionais.
64- Assim, foram várias as tentativas dos defensores da Teoria de Gênero de implantá-la de forma ilegal e alapada, por meios administrativos em políticas públicas governamentais, principalmente naquelas voltadas para os direitos humanos e a educação, ainda que contra as leis e a Constituição do país.
65- A primeira iniciativa para a tentativa de inclusão da sexualidade na perspectiva de gênero como tema a ser discutido nas escolas se deu em 1997, há mais de vinte anos, por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN[8] para o ensino fundamental, documento este, por sinal, seguido pela Ré segundo menciona na sua resposta ao Ministério Público.
66- O documento enfatiza a importância da discussão das relações de gênero, na medida em que propicia o questionamento de papéis rigidamente estabelecidos para homens e mulheres na sociedade e a necessidade de flexibilização desses papéis.
67- No ano de 2003 foi lançado o Projeto Saúde e Prevenção nas Escolas – SPE, em uma parceria do Ministério da Educação – MEC, com a UNESCO[9], cujo público-alvo eram crianças e jovens de 10 (dez) a 24 (vinte e quatro) anos de idade, matriculados em escolas públicas.
68- O SPE foi reformulado em 2005, sendo incorporado ao Programa Saúde na Escola – PSE[10], constando também dos seus objetivos a discussão sobre relações de gênero e sexualidade no âmbito escolar, reconhecendo a escola como a instância privilegiada para o exercício da cidadania, considerando seu presumível papel na promoção das mudanças sociais. Em outras palavras menos eufemísticas, o Programa considera a escola como um lugar mais propício para doutrinação do que para aprendizagem.
69- No ano de 2006, pressões internacionais levaram o MEC a criar o Programa Gênero e Diversidade na Escola – GDE, o qual tem por objetivo preparar os professores da rede pública de ensino a lidarem no cotidiano das escolas, de forma transversal, contra as discriminações de gênero e raça, considerando a uma hipotética imbricação social dos temas.
70- Há pouco tempo, o governo federal tentou implementar o Programa Brasil sem Homofobia, que acabou sendo abortado ante a resistência do Congresso Nacional contra o material dito educativo que o Programa veiculava, que no seu entender incentivaria as crianças e adolescentes a desenvolverem comportamentos homossexuais.
71- A título de ilustração, há uma animação destinada à veiculação no âmbito escolar, a qual pode ser vista no You Tube[11], onde se conta a estória de um adolescente que em uma aula de matemática sobre probabilidade, acaba percebendo que poderia ser socialmente mais vantajoso para ele estar aberto para relacionar-se sexualmente com pessoas de ambos os sexos, pois, desse modo, poderia ter um leque maior de amizades, como se as relações afetivas estabelecidas entre as pessoas necessariamente dependessem da prática ou de interesses sexuais.
72- Como se pode observar, nas duas últimas décadas, no Brasil, onde tem sido notória a dificuldade dos governos sucessores em dar continuidade à políticas públicas, ou até mesmo à conclusão de simples obras de administrações anteriores, ironicamente, sob a pressão e orientação de um organismo internacional, ao arrepio da lei e da Constituição da República, a Teoria de Gênero vem sendo implantada já há mais de duas décadas de forma fluente e eficaz, consubstanciando-se como uma típica política de Estado.
73- Na verdade, os defensores da Teoria de Gênero sabem que se ela vier a ser discutida abertamente no Parlamento dificilmente terá sua agenda aprovada, considerando a inevitável exposição de suas inconsistências e a óbvia resistência da sociedade civil organizada.
74- Com efeito, foi exatamente o que ocorreu, inicialmente com a retirada de qualquer alusão às ideias da Teoria de Gênero no Plano Nacional de Educação – PNE, pelo Congresso Nacional.
75- O Projeto de Lei do PNE para o decênio 2014/2024 continha no inciso III do artigo 2º[12] uma referência explícita à tais ideias, quando propunha como diretriz a superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade de gênero e de orientação sexual.
76- Com a apresentação de substitutivo no Senado Federal a referência à Teoria de Gênero foi suprimida, permanecendo a seguinte redação:
Artigo 2º – são diretrizes do PNE:
…
III – superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação;
77- Logo após a aprovação do PNE, o Ministério da Educação – MEC retirou da versão final da Base Nacional Comum Curricular – BNCC, todos os trechos que faziam referência à identidade de gênero, sendo esta posteriormente aprovada pelo Conselho Nacional de Educação – CNE.
78- Neste passo, diz o caput do artigo 227 da Constituição da República[13] que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, todos os direitos inerentes ao ser humano ali descritos, devendo, ainda, na aplicação desses direitos, ser considerada sua condição de pessoa em desenvolvimento.
79- Isto quer dizer que ao se concretizar qualquer direito ou interesse de um infante, o operador da lei não pode tratá-lo como um adulto pequeno, sendo bastante claro que o que vale para uma pessoa adulta, nem sempre é bom para a criança ou o adolescente.
80- É o que se denomina Doutrina da Proteção Integral, insculpida em toda a legislação protetiva e explicitada nos artigos 3º e 6º e incisos I, II e IV do parágrafo único do artigo 100 da Lei 8.069/1990, os quais garantem a preponderância dos interesses da criança e do adolescente contra qualquer outro direito que com o deles colida, seja do Estado, da sociedade e, eventualmente, até mesmo dos pais, verbis:
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
Art. 100 – Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.
Parágrafo único. São também princípios que regem a aplicação das medidas:
I – condição da criança e do adolescente como sujeitos de direitos: crianças e adolescentes são os titulares dos direitos previstos nesta e em outras Leis, bem como na Constituição federal;
II – proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares;
…
IV – interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto;
81- Neste contexto, compete ao Ministério Público, na qualidade de Instituição encarregada da defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis das crianças e adolescentes, o dever de velar por tais valores, tomando as medidas judiciais e extrajudiciais necessárias a sua proteção.
82- Seguindo tal linha de raciocínio, considerando serem as crianças e os adolescentes ainda incapazes de tomarem todas as decisões da vida por si mesmos, devem ser eles cuidados pelos pais, que exercem o poder familiar sobre os filhos, o qual é inscrito no artigo 229 de nossa Carta Magna[14] e regulamentado nos artigos 1630 a 1638 do Código Civil[15], onde se elencam e se destacam uma série de direitos e deveres da mãe e do pai, dentre eles o de guarda e o de dirigir a criação e a educação dos filhos, podendo, inclusive, ser responsabilizados se praticarem com esses últimos atos contrários à moral e aos bons costumes.
83- Logo, a ordem estabelecida pelo caput do artigo 227 da Constituição federal não é aleatória, pois cabe primeiro aos pais educar os filhos e não ao Estado, que apenas excepcionalmente intervém e, eventualmente, pode até vir a substituir a família em tal tarefa apenas ante o descumprimento de seus deveres legais e sempre na defesa dos superiores interesse da criança e do adolescente.
84- Assim, as hipóteses de intervenção estatal são muito restritas e expressamente definidas em lei e dependem da ocorrência de uma situação de risco prevista nos incisos do artigo 98 da Lei nº 8.069/1990, verbis:
Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III – em razão de sua conduta.
85- Nestes casos, em nome do superior interesse do infante, cabe ao Estado aplicar ao mesmo as denominadas medidas de proteção, todas de cunho social e com o objetivo de restaurar a normalidade das relações familiares, colocando um fim ao risco vivido pela criança ou adolescente.
86- As medidas protetivas estão previstas na legislação e podem culminar até mesmo com o acolhimento institucional ou familiar do infante, mas a sua natureza será sempre transitória e com a finalidade de devolvê-lo à família biológica ou de colocá-lo no seio de uma família substituta, seja sob a forma de guarda ou adoção.
87- A prioridade dada à convivência familiar é reconhecida também no § 2º do artigo 19 da Lei 8.069/1990[16], que limita o tempo de permanência da criança ou adolescente em uma entidade de acolhimento em até dezoito meses, dependendo a continuidade do seu acolhimento institucional de decisão devidamente fundamentada da autoridade judiciária.
88- Em tal conjuntura, as medidas intervencionistas mais extremas somente poderão ser aplicadas por decisão judicial e após a prática de um ato infracional grave pelo adolescente, fato que poderá dar ensejo à aplicação de uma medida socioeducativa restritiva de liberdade, oportunidade em que o Poder Público, por um prazo definido, na prática, substituirá os pais no papel de educar os filhos.
89- Fora destas possibilidades (necessidade de aplicação de medidas protetivas e socioeducativas), sempre com o objetivo de proteger o desenvolvimento e a integridade da criança e do adolescente, não é possível ao Estado ou à sociedade interferir na educação que os pais dão aos filhos, de modo a contrariá-la frontalmente ou desvirtuá-la, o que é corroborado pelo item 4 do artigo 12 da Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San Jose da Costa Rica, que dá ao pai e à mãe o direito de os respectivos filhos receberem a educação religiosa e moral que esteja de acordo com suas próprias convicções, verbis:
Artigo 12 – Liberdade de Consciência e de Religião
…
4. Os pais, e quando for o caso os tutores, têm direito a que seus filhos ou pupilos recebam a educação religiosa e moral que esteja acorde com suas próprias convicções.
90- Por conseguinte é de suma importância definir e contextualizar a natureza jurídica da entidade familiar, considerada a base da sociedade brasileira e merecedora da especial proteção do Estado, conforme dispõem os parágrafos 3º, 4º e 5º do artigo 226 da Constituição da República, verbis:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
…
§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.
91- De acordo com a norma constitucional, quando se fala de família sob a perspectiva humana, não se pode excluir a união entre um homem e uma mulher, pelo simples motivo de que fora de tal conjunção não há a possibilidade de reprodução da espécie.
92- Nesse ponto, a norma constitucional nada mais é do que uma representação da nossa própria natureza, afirmando, ainda, sua imutabilidade e a inutilidade de qualquer tentativa de alterá-la, fato comprovadamente causador de dores, sofrimentos e de tragédias sociais ao longo da História.
93- Arthur Schopenhauer, percuciente, assim discorre:
“…quando consideramos tudo isso, somos levados a exclamar: para que tanto barulho?! Trata-se simplesmente de cada João encontrar sua Maria: por que tal ninharia deveria desempenhar um papel tão importante e trazer sem cessar perturbação e confusão para a vida humana bem-regrada? – Mas ao investigador sério o espírito da verdade revela aos poucos a resposta: não é nenhuma ninharia, mas a importância da coisa é perfeitamente adequada à seriedade e ao ardor dos impulsos. O fim último de toda disputa amorosa, seja ela com borzeguim ou coturno, é realmente mais importante que todos os outros fins da vida humana, e, portanto, merece por inteiro a seriedade profunda com que cada um o persegue. De fato, o que é decidido não é nada menos do que a composição da próxima geração”. (Metafísica do Amor, p.8, 1ª edição, Ed. Martins Fontes, 2000).
94- Não é por outro motivo que o § 3º do artigo 226 da nossa Carta Magna reconhece expressamente e prioriza a união estável entre o homem e a mulher, como entidade familiar, refletindo e afirmando a natureza binária do ser humano, dividido entre os sexos masculino e feminino.
95- Não obstante a jurisprudência reconhecer a existência de outros tipos de arranjos familiares, a união entre um homem e uma mulher é a regra natural das coisas por obviamente ser a única que permite a perpetuação da espécie humana.
96- Nesse passo, é importante esclarecer que o fato da Constituição federal reconhecer a existência de dois sexos e indicar a importância de tal configuração para a formação da família e a constituição do próprio Estado brasileiro, isso não quer dizer, absolutamente, que estejam automaticamente excluídos do reconhecimento e da proteção legal os raros casos de pessoas que tenham nascido sem uma definição sexual, bem como aquelas que eventualmente direcionem o seu desejo sexual para o mesmo sexo, ou para ambos, pois este tipo de discriminação feriria o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Ademais, é notório o reconhecimento dos direitos civis de tais pessoas por nossa sociedade dita heteronormativa, a qual não vê tais situações como um problema.
97- Na verdade, o problema que ora se apresenta está exatamente na tentativa da imposição no ambiente escolar de uma doutrina que tem o claro objetivo de subverter a nossa ordem jurídico-constitucional e social, na medida em que nega e tenta sabotar a natureza binária da espécie humana, pretendendo dificultar ou impedir sua reprodução, afrontando o contido na Constituição da República, a qual reconhece, expressamente, a existência dos dois sexos e a inarredável importância da sua relação no conceito de família e na geração da prole.
98- Outrossim, quando a Lei nº 8.069/1990 estabelece nos seus artigos 15 a 18[17] o direito do infante ao respeito e à dignidade como uma pessoa humana em processo de desenvolvimento e como sujeito de direitos humanos, não se pode dissociar seus interesses da sua natureza humana.
99- Quando a lei diz que a criança e o adolescente são invioláveis na sua integridade física, psíquica e moral, incluindo aí sua imagem, identidade pessoal, autonomia de valores, ideias e crenças, não é possível desconsiderar que nascemos homens ou mulheres, cujas raras exceções existentes apenas servem para confirmar a regra.
100- Neste ínterim é importante esclarecer as maneiras de como se está tentando inserir tais ideias extravagantes em nosso país, inclusive nas escolas, por meio de atividades supostamente pedagógicas, apesar do claro repúdio do legislador pátrio pelas mesmas.
101- Com efeito, o atual proselitismo feito por parte da mídia sobre os pontos de vista de tal teoria, não tem o condão de imprimi-la no espírito das pessoas, pois tal ação atinge, principalmente, a população adulta com opinião já formada, sendo certo que os pais e as famílias ainda funcionam, de um modo ou de outro, como uma barreira ou filtro para as informações e a propaganda que os filhos recebem das mídias em geral, dificultando a inculcação desse tipo de ideia nas gerações futuras.
102- A resposta a isto nos leva à análise da estratégia de infiltração dos defensores da Teoria de Gênero desenvolvida em vários países e levada a cabo principalmente por meio das suas respectivas redes de ensino. Na sua visão, a escola seria o caminho mais fácil e viável para se condicionar toda uma população, pois nos bancos escolares se encontra um público cativo, com personalidade ainda em formação e mentalmente moldável.
103- Como se descreveu acima, ainda estamos vendo outras tentativas de inclusão das questões de gênero no sistema de ensino nacional, não por possuírem algum aspecto pedagógico, como os defensores da Teoria de Gênero vêm falsamente afirmando, mas como estratégia de conquista dos corações e mentes das futuras gerações.
104- Do ponto de vista prático, seguindo a doutrina retromencionada, o ardil consiste em começar a desconstruir a sexualidade natural, taxando indistintamente os papéis sociais desempenhados por pessoas dos sexos masculino e feminino como estereótipos ou clichês, dizendo serem estes o fruto de uma repetição automática de um modelo impessoal anterior, sem qualquer influência, por menor que seja, da biologia humana.
105- Neste passo, quando se adota uma teoria onde a natureza sexual de nossa espécie é questionada, em primeiro lugar é preciso relativizar a importância desse fato no desenvolvimento da sociedade humana por um lado e, por outro, demonizar sua influência política e econômica, apontando-o como a grande responsável por todos os males sociais.
106- Assim, os defensores da Teoria de Gênero não têm qualquer pudor em começar a doutrinação por crianças na mais tenra idade, ainda na educação infantil, orientando os educadores a fazê-las acreditar cada vez menos nos pais e mais nas instituições de ensino enquanto representantes do ente estatal, para, no final do ensino básico, ser possível ao adolescente confrontar os valores morais da respectiva família.
107- Há, na prática, a adoção no âmbito escolar de algumas dinâmicas, também supostamente pedagógicas, consistentes na tentativa de confundir a cabeça das crianças e, paulatinamente, ir afastando o infante, desde a pré-escola, de qualquer influência externa vinculada a sua origem sexual biológica, com, por exemplo, adoção de um gênero neutro para designar o conjunto do alunado, proibindo-se a referência aos papéis sexuais masculino e feminino e até a tentativa da sua inversão, com a troca forçada de roupas e acessórios usualmente destinados a meninos e meninas.
108- É o que está ocorrendo em países onde a teoria de gênero vem sendo adotada como uma política oficial nos educandários, como a Alemanha, o Canadá e em alguns estados dos Estados Unidos da América, como a Califórnia e em algumas escolas do Brasil.
109- Em nosso país, agem de forma dissimulada, ilegal e inconstitucional e sob a égide de uma suposta defesa dos direitos humanos, começam a tentar adotar ainda uma outra providência, que é a de, aos poucos, legitimar a pedofilia colocando-a como um tipo de orientação sexual, tudo feito concomitantemente com outras iniciativas, que incentivam a erotização precoce de crianças e adolescentes.
110- Afinal, se uma teoria entende a sexualidade como algo restrito exclusivamente ao campo da subjetividade, ressaltando-a como a realização hedonista do exercício da autonomia e da liberdade individual, livre das eventuais amarras impostas pelos limites morais e legais da organização social, nada mais natural do que advogar a prática sexual por e com crianças e adolescentes, defendendo, para isso, sua autonomia como pessoas detentoras de direitos sexuais.
111- Sendo o sexo com crianças e adolescentes menores de quatorze anos de idade um tabu moral e crime previsto na legislação penal[18], obviamente não será de uma hora para outra que este tipo de conduta poderá ser abertamente defendida, como um direito sexual de qualquer ser humano.
112- Desse modo, aos poucos, disfarçadamente, a introdução da pedofilia como um direito natural já foi iniciada em nosso país nos meios acadêmicos, através do financiamento de estudos que questionam a abordagem exclusivamente negativista das atuais políticas públicas, que associam o sexo com crianças e adolescentes somente à violações, compreendendo-o de forma restrita e como sinônimo do combate ao abuso, à exploração e à violência sexual (documento de fls. 364/383).
113- Se isto não bastasse, também já estão sendo veiculadas reportagens na grande mídia, onde se aponta a pedofilia como uma doença, para qual a pessoa necessitaria exclusivamente de tratamento médico. A ideia é divulgar o slogan “pedofilia é doença”, com a finalidade de confundir a opinião pública, descolando de forma proposital a figura do pedófilo da do criminoso.
114- O argumento jurídico apresentado como justificador do início da prática sexual por e com crianças é o de que não seria lícito criar um direito à proteção suprimindo outro direito da pessoa, no caso o direito à sexualidade, posto que em um Estado Democrático de Direito não haveria hierarquia entre os direitos, mas sim transversalidade. Fazem, deste modo, severas críticas às políticas protetivas da criança, que abordam a questão da sexualidade na infância exclusivamente como uma violação da sua personalidade.
115- Por incrível que pareça, com o intuito de erradicar as políticas públicas protetivas do universo infantojuvenil e perseguir o objetivo de descaracterizar, abolir, ou pelo menos mitigar a pedofilia como algo negativo, os defensores da Teoria de Gênero colocam tal prática como sinônimo de cidadania, liberdade e democracia, noutras palavras, mais uma vez, como designação de direitos humanos, na clara tentativa de atacar e inverter o discurso legal e constitucional protetivo e criminalizante.
116- A meta da Teoria de Gênero é a inversão dos valores estabelecidos pela sociedade e para isso ataca diretamente sua heteronormatividade, ou a normalidade das relações entre homens e mulheres, questionando os papéis por ambos nela desempenhados, afastando qualquer análise mais profunda que os ligue à natureza sexual binária da espécie humana.
117- Partem do pressuposto que a sociedade heteronormativa é antidemocrática, desprezando a isonomia de direitos hoje existente entre os homens e as mulheres, bem como o reconhecimento de direitos fundamentais do público homossexual.
118- É importante lembrar, como se viu alhures, que não importa se a população do país entenda, concorde ou discorde da Teoria de Gênero, pois a mesma é sempre apresentada como uma proposta de fundo “técnico” e sob o véu de um discurso impositivo, falsamente democrático e pretensamente baseado na defesa dos direitos humanos.
119- Destarte, há um documento produzido pela UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura, que estabelece uma linha de ação básica para a adoção da Teoria de Gênero no âmbito escolar, que, ao arrepio da lei, foi adaptado à realidade do nosso país.
120- No caso do Brasil, tal instrumento consiste nas Orientações Técnicas de Educação em Sexualidade para o Cenário Brasileiro – Tópicos e objetivos de aprendizagem ( documentos de fls. 392/453), adequada pela representação local da referida Agência da ONU.
121- Afirmando ser a igualdade de gênero a sua prioridade, sob o hipotético manto da mais estreita tecnicalidade e alegando basear sua orientação em evidências e experiências práticastiradas não se sabe de onde, a UNESCO pretende direcionar o governo, os professores e diretores escolares a iniciar a implantação da doutrina e ideias defendidas pela Teoria de Gênero, atacando a alegada heteronormatividade da sociedade brasileira.
122- Como sói acontecer nesses casos, a escola passa a ser vista não como um lugar de transmissão do saber, mas como um locus privilegiado de aprendizagem de valores e atitudes para a construção de uma nova ética revolucionária que presumivelmente defenda os direitos humanos.
123- Neste passo, não é difícil notar que os direitos humanos são um conceito chave para a implantação dos valores defendidos pela Teoria de Gênero nas escolas brasileiras, funcionando como uma espécie de Cavalo de Tróia, onde se possa, sem que se perceba, levar extravagantes ideologias para o dia-a-dia do alunado, colocadas sempre de forma transversal, em várias matérias da grade escolar.
124- A ideia é fazer uma espécie de lavagem cerebral nas nossas crianças e adolescentes, inserindo um tema ou assunto que permeie todas as disciplinas ministradas da pré-escola ao ensino médio, passando pelo ensino fundamental.
125- Com efeito, tendo como pressuposto a imbricação das ideias de gênero com a defesa dos direitos humanos, como se tal doutrina pudesse incluir uma teoria que contraria e rechaça a própria natureza humana, o documento da UNESCO ataca a família, questiona a autoridade dos pais e o exercício do poder familiar pelos mesmos.
126- Inicialmente, é fácil constatar que cada um dos conceitos-chave propostos no documento têm por objetivo estabelecer uma suposta “reflexão” sobre o que é a família, com o fim de tentar igualar a organização familiar capitaneada pelos pais, a quaisquer grupos de pessoas unidas por laços de afetividade.
127- Se isso não bastasse, de forma sutil, os pais são sistematicamente alienados e seu papel legal esquecido para serem colocados em pé de igualdade, ou em um mesmo patamar, com qualquer outra pessoa adulta dita da “confiança”da criança, como se crianças e adolescentes tivessem a plena capacidade de analisar e distinguir a real intenção de todos os adultos que fazem parte de seu círculo de relacionamentos.
128- Na verdade, tais ideias pretendem mitigar e suprimir a influência dos pais na educação dos filhos, evidenciando-se, antes de tudo, como um claro incentivo à pedofilia, pois tal prática criminosa é levada a cabo, na maior parte das vezes, exatamente por pessoas próximas e da “confiança” da criança ou adolescente.
129- O propósito de diminuir a importância da família e o papel dos pais na educação dos filhos é concomitante com a pretensão de se ampliar e acentuar a influência do Estado no cotidiano de infantes e jovens, afirmando que os seus valores pessoais, por exemplo, morais e religiosos, somente devem ser considerados se estiverem de acordo com a versão dada por eles de direitos humanos.
130- Deveras, o que estamos vendo, mais uma vez, é a reprodução de um perigoso discurso despótico e autoritário, feito sob o escudo de um conceito ideológico e politizado de direitos humanos, que como se viu, contraditoriamente, inclui até mesmo a defesa de práticas pernósticas e antinaturais, como o incesto e a pedofilia.
131- No documento da UNESCO o conceito de direitos humanos é apresentado como inerente à questão de gênero, o qual funciona como vetor de tal teoria no âmbito do ensino, cuja doutrina deve prevalecer sobre os valores transmitidos pela família, sempre apontados como negativos e prejudiciais, em claro desrespeito à lei e a norma constitucional. A sobreposição do tema com o conceito de identidade de gênero, pode ser sistematicamente observado em vários pontos do documento da UNESCO, onde sua violação constituiria em uma infração aos direitos humanos.
132- O escrito é claramente centrado em investidas contra a heteronormatividade prevista na lei e na Constituição da República, na medida em que apresenta a sexualidade e o gênero como manifestações exclusivamente dependentes da cultura, portanto, radicalmente mutáveis.
133- Por conseguinte, se nossos padrões sexuais decorrem apenas das relações historicamente estabelecidas, tudo pode ser mudado ou mesmo virado de ponta-cabeça e o que hoje é válido pode não o ser amanhã, e o que é um interdito ou tabu aqui, como a pedofilia e o incesto, pode ser autorizado acolá.
134- Essa relatividade radical das funções sexuais defendida pela Teoria de Gênero, fincadas no documento da UNESCO, é consubstanciada em inúmeras ideias-chave nele apresentadas, que de forma simplista e dogmática tratam como meros esteriótipos todas as tarefas socialmente atribuídas a um sexo ou ao outro, ficando clara sua intenção de solapar a ordem social vigente, na medida em que nega as condições masculina e feminina e afirma, de forma categórica, que os cognominados estereótipos de gênero prejudicam a vida de homens e mulheres e devem, por isso, ser suprimidos das relações sociais.
135- Como se pode observar da documentação juntada à presente Ação Civil Pública, a Ré, embora negue, colocou em prática o ideal e os desígnios da agenda de gênero, incorporando o assunto em disciplinas ministradas aos seus alunos da 3ª à 6ª série do ensino fundamental.
136- Às fls. 20, 20v, 21, 38, 42, 46, 96 e 98do ICP afirma a Ré que a cultura é desvinculada da natureza biológica, de modo a justificar qualquer tipo de comportamento ou identidade sexual. Às fls. 20, 20v, 21 e 60, introduz o conceito e a terminologia da Teoria de Gênero para seu alunado, desconsiderando a perspectiva biológica binária da espécie humana.
137- Seguindo a linha de pensamento da Teoria de Gênero às fls. 79 e 123 à 163 do ICP, com o objetivo de questionar e relativizar os papéis que afirma serem atribuídos pela sociedade a homens e mulheres, critica as limitações de comportamento supostamente impostas a meninos e meninas pelos mesmos, atribuindo-lhes a origem dos males e desigualdades sociais.
138- No mês de agosto do corrente ano, a Ré realizou junto aos seus alunos do ensino médio o que denominou Simulação Interna Agostiniana-SIA, sendo que em um dos seus quadros abordou um certo experimento iniciado na Suécia, onde crianças começaram a ser criadas sem diferenças de sexo (documento de fls 460/478).
139- Seguiu os passos estabelecidos pela cartilha da UNESCO, na medida em que introduziu na sala de aula a agenda de gênero para seu alunado ao apresentar novos conceitos, reinterpretando concepções atuais e usando como pretexto uma suposta defesa da igualdade entre homens e mulheres, meninos e meninas, expôs seus alunos a uma situação de risco pessoal, doutrinando-os com um tema que contraria as leis e a Constituição federal.
140- Seguindo as ditas normas técnicas internacionais adaptadas à realidade brasileira, defendeu abertamente o conceito de identidade de gênero, afirmando serem os comportamentos sexuais masculino e feminino algo definido apenas pela cultura e mutável no tempo e no espaço, desconsiderando e omitindo uma discussão mais ampla sobre a influência do meio ambiente e a resposta da biologia na definição dos papéis atuais de homens e mulheres, podendo provocar, até mesmo, possíveis desavenças familiares dos alunos com os pais.
141- Na medida em que tais papéis são tachados de estereótipos e mostrados aos seus alunos, crianças ainda em desenvolvimento, como a causa principal de injustiças sociais, acaba por induzir nos mesmos a necessidade de questioná-los e alterá-los como algo necessariamente equivocado, pernicioso e comprometedor das relações entre homens e mulheres.
142- Desta maneira, a Ré veio a questionar o modelo de família heteronormativa previsto constitucionalmente, como se uma hipotética coletividade justa e livre de preconceitos só fosse possível com a subversão e dissolução da sociedade em que vivemos.
143- Por conseguinte, deu os primeiros passos para a implementação das ideias e princípios da Teoria de Gênero dentro das suas salas de aula, expondo inúmeras crianças a uma doutrina exótica e radical, contrária à própria natureza humana e conflitante com a legislação protetiva, notadamente com o contido no artigo 5º da Lei 8.069/1990[19], que garante à criança e ao adolescente o direito de não ser objeto de nenhum tipo de negligência, devendo ser punido qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais, como a inviolabilidade da sua integridade psíquica e moral, a qual abrange a preservação da sua imagem, identidade, valores, crenças e ideias.
144- Como se vê, a Ré violou o dever geral imposto a todos, previsto no artigo 227 da Constituição federal, de prevenir a ocorrência de ameaça ou violação de quaisquer direitos desse público-alvo.
145- Também desrespeitou o contido no § 3º do artigo 226 da nossa Carta Magna, que define como regra o conceito de família heteronormativa, considerando ser este tipo de unidade familiar o único capaz da perpetuação da espécie.
146- A Ré atacou tal tipo de organização familiar, tentando convencer seus alunos de que o mesmo é o vilão e o principal responsável pelas eventuais limitações das relações interpessoais entre homens e mulheres, apresentando de forma parcial e superficial seus valores e as tarefas desempenhadas por seus membros, impondo uma forma de doutrinação às pessoas imaturas e com seu senso crítico ainda em formação.
147- Destarte, infringiu o disposto no artigo 257 da Lei nº 8.069/1990, que considera infração administrativa o descumprimento da obrigação constante do artigo 79 do mesmo diploma legal, o qual determina o respeito dos valores éticos e sociais da pessoa e da família por qualquer tipo de publicação destinada ao público infantojuvenil, verbis:
Art. 257. Descumprir obrigação constante dos artigos 78 e 79 desta Lei:
Pena – multa de três a vinte salários de referência, duplicando-se a pena em caso de reincidência, sem prejuízo de apreensão da revista ou publicação.
Art. 79. As revistas e publicações destinadas ao público infantojuvenil não poderão conter ilustrações, fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família.
148- Tal conduta da Ré feriu igualmente o contido no inciso II do § 3º do artigo 220 da Constituição da República[20], que tem por finalidade proteger as pessoas e a família de serviços nocivos à saúde das crianças e infringiu, da mesma forma, o seu dever de prevenir qualquer ocorrência de ameaça ou violação aos direitos dos infantes, na medida em que prestou um serviço onde passou a seus alunos informações desrespeitosas e inadequadas à sua condição peculiar de pessoas em desenvolvimento.
149- Com seu comportamento a Ré feriu os direitos do seu alunado estabelecidos pela legislação protetiva e pela Constituição da República e os interesses das suas respectivas famílias, os quais são passíveis de reparação.
150- Assim, está sujeita à responsabilização pela inobservância das normas de proteção contidas na Lei nº 8.069/1990 e em nossa Carta Magna, na medida em que lesou um bem jurídico inerente ao ser humano, no caso crianças entre 9 e 12 anos de idade, ferindo sua dignidade pessoal e integridade moral e psicológica, colocando-as em grave situação de risco pessoal.
151- Com sua ação a Ré violou os direitos da personalidade de inúmeros infantes, que tiveram contato com o material didático impróprio para sua idade, usado nas aulas a eles ministradas, onde foram expostos à dinâmicas indevidas.
152- Abusando do dever de educar, usou o âmbito das escolas pelas quais é responsável, aproveitando que os filhos não estão sob a vigilância direta dos pais, dificultando a ciência dos mesmos sobre o que aconteceria nas salas de aula.
153- Fazendo uso de materiais e de dinâmicas inadequados, a Ré colocou em situação de risco pessoal parte do seu alunado, na medida em que desrespeitou o seu direito ao sadio desenvolvimento, atingindo a inviolabilidade da sua integridade psíquica e moral, descumprindo o dever legal e constitucional imposto a todos, de prevenir a ocorrência de qualquer ameaça ou violação dos direitos de uma criança ou adolescente.
154- Com sua atuação socialmente reprovável, onde colocou seus próprios interesses antes dos da coletividade, a Ré praticou atos desrespeitosos que causaram mal-estar na sociedade, atingindo a esfera moral de inúmeras crianças matriculadas nas suas unidades de ensino.
155- Destarte, independente da sua responsabilidade administrativa por infração às normas do Estatuto da Criança e do Adolescente, deve a Ré ser responsabilizada pelo desrespeito e o dano que causou ao patrimônio moral de seus alunos.
III – DO PEDIDO
Ante o exposto o Ministério Público do Estado de Minas Gerais requer:
a) Seja a Ré condenada a pagar a título de indenização por dano moral coletivo, o valor correspondente às mensalidades e à matrícula do ano de 2017 de todos os alunos matriculados da 3ª a 6ª séries do ensino fundamental, das unidades de Belo Horizonte, Nova Lima e Contagem do Colégio Santo Agostinho, considerando a situação de risco a que foram expostos no âmbito das referidas escolas, nas aulas a eles ministradas, ante o ensino de matérias, uso de práticas, de material e de dinâmicas indevidos, inadequados ou incompatíveis com a respectiva idade, o que veio a prejudicar o desenvolvimento psíquico e moral dos mesmos, considerando serem pessoas ainda em desenvolvimento, cujo montante deverá ser destinado ao Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belo Horizonte, nos termos do artigo 214 da Lei nº 8.069/1990;
b) Seja a Ré condenada pela prática da infração administrativa prevista no artigo 257 da Lei nº 8.069/1990, por ter veiculado como material didático para seus alunos mencionados na alínea a, supra, publicações de conteúdo impróprio, as quais desrespeitaram os valores éticos e sociais da pessoa e da família;
c) A citação da Ré, na pessoa do seu Presidente Pe. Pablo Gabriel Lopez Blanco, no endereço em epígrafe, para contestar a presente ação, caso queira.
Requer seja julgada procedente a totalidade do pedido contido na presente ação.
Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em Direito admitidos, requerendo a juntada dos documentos constantes do Inquérito Civil Público nº MPMG 0024 17 017735-6.
Nos termos do inciso VII do artigo 319 do CPC, opta pela não realização da audiência de conciliação ou de mediação.
Dando à causa o valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais), embora isenta de custas na forma do artigo 219 da Lei nº 8.069/1990.
Pede deferimento.
Belo Horizonte, 11 de setembro de 2018.
Celso Penna Fernandes Júnior Maria de Lurdes Rodrigues Santa Gema
Promotor de Justiça Promotora de Justiça
[1]Lei 8.069/1990 – Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:
I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;
III – em razão de sua conduta.
[2] FIRESTONE, Shulamith. A Dialética do Sexo: um manifesto da revolução feminista. Tradução de Vera Regina Rabelo Terra. Coleção de Bolso. Rio de Janeiro: Labor do Brasil, 1976.
[3]In “A Dialética do Sexo”, pág 276, 1976, Rio de Janeiro, Labor
[4] <https://www.acpeds.org/the-college-speaks/position-statements/gender-ideology-harms-children>
[5] <https://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Jornal&id=2218>
[6] <https://robertatrindade.wordpress.com/policiais-mortos-e-baleados-em-2017/>
[7]<https://www.youtube.com/watch?v=G0J9KZVB9FM>
[8]<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro06.pdf>
[9]< http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_prevencao_escolas.pdf> .
[10] <http://portal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal/194-secretarias-112877938/secad-educacao-continuada-223369541/14578-programa-saude-nas-escolas>
[11] <https://www.youtube.com/watch?v=tKFzCaD7L1U>
[12]Lei nº 13.005 /2014 – Art. 2o São diretrizes do PNE:
…
III – superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual;
[13]Constituição federal – Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão
[14] Constituição federal – Art. 229 – Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.
[15] Código Civil Brasileiro – Art. 1.630. Os filhos estão sujeitos ao poder familiar, enquanto menores.
Art. 1.631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com exclusividade.
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Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste enquanto aos filhos:
I – dirigir-lhes a criação e a educação;
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VIII – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
IX – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.
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Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.
Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
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II – deixar o filho em abandono;
III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
[16]Lei nº 8.069/1990 – Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral.
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§ 2o A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 18 (dezoito) meses, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária.
[17] – Lei nº 8.069/1990 – Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I – ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II – opinião e expressão;
III – crença e culto religioso;
IV – brincar, praticar esportes e divertir-se;
V – participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI – participar da vida política, na forma da lei;
VII – buscar refúgio, auxílio e orientação.
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
[18] – Código Penal Brasileiro – Art. 217-A – Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos:
Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.
§ 1o Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência
§ 2o(VETADO)
§ 3o Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§ 4o Se da conduta resulta morte:
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
[19]Lei nº 8.069/1990 – Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
[20]Constituição federal – Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
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§ 3º Compete à lei federal:
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II – estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.